Categoria: Poesia

  • Poesia reunida

    Carlos Augusto Corrêa é poeta carioca nascido em 1948. Este livro reúne toda a sua poesia, produzida entre 1977 e 2022. Incorpora títulos publicados em coletivas e de pequenas tiragens, como Elegia sem posse (1987), Junção (1979) e Uma palavra no dia (1977) e e outros inéditos, como De corpo e (c)alma (1999) e Poemas esparsos (2000). Além disso reedita duas obras-primas da poesia brasileira Orgia do escuro (2000) e Terra presente (1992). O volume também contém o livro de poemas eróticos Canto e gozo (2022), lançado originalmente pela Editora TextoTerritório. O movimento proposto pelo poeta, além de inusual nas louvações costumeiras da poesia e dos poetas, permite ao leitor uma abordagem densa da poesia imiscuída de vida; da vida que se embebeda de sarjetas, de esperma e gozo, de trabalho, que vai ao âmago do próprio viver e cria um amalgama forte, cristalino e provocador seja da poesia, seja da vida, ou de um modo de vivê-la.

  • Arredores

    No centro dos poemas de Arredores estão “meu pai e o museu” (“foi meu pai/que pouco sabia ler/que me levou pela primeira vez/ao museu nacional”) “deste modo” (“ao perceber que nunca fui à varanda bater panelas/deixou de ser amistosa”) e “o vizinho do quinto andar” (“vi ontem no jornal/nada mais disse/repetia simplesmente”): poemas extraordinários, que começam a deixar ver com clareza o que antes apenas era o vislumbre da beleza da tarde, o doce pássaro da juventude, a transubstanciação própria da boa poesia dando-se em nesgas, frestas, elipses. É a partir sobretudo daqueles três poemas centrais que o livro se vertebra e deixa ver o que antes apenas entrevíamos: o olhar humanista do poeta compõe um todo que diz a que veio, diz onde está e diz quando é este quando no qual nos situamos: os arredores de um país em que, pensando bem, “homens de bem” talvez não o sejam sem aspas, em que o assassinato de estudantes pobres nas vielas é prioridade para as forças policiais frente aos helicópteros dos grandes traficantes, em que a masturbação de um morador de rua ultraja mais do que cortes de investimentos em educação e saúde, em que o “bicho” de Manuel Bandeira tem seu traço distintivo detectado no aparente monturo num canto de rua: “é um homem certamente/ tem na mão um pedaço de pão.”

  • Mar Salgado

    O novo livro de Elesbão Ribeiro, Mar salgado, traz a inconteste assinatura de seu autor. Elesbão vem publicando com frequência desde o ano de 2013, quando estreou com Estação piedade. Sua obra, ao longo destes dez anos, a cada novo livro, a cada novo poema, a cada verso, vem admirando seus antigos leitores e conquistando outros tantos. A dicção de Elesbão Ribeiro é feita de sutilezas e de uma grande dose de simpatia por seus personagens, geralmente gente humilde, sem arroubos; da ordem do cotidiano o poeta extrai, não só sua educação sentimental, como a percepção das pessoas marcadas pela sensibilidade para com os fatos diversos e comezinhos do mundo. Como se não bastasse, esta extração se dá através do mergulho nos poemas e músicas de sua predileção e da transformação deles em obra própria. A transfiguração operada transforma os Pessoas, os fadistas, o Sr. José Saramago em Elesbão Ribeiro. Este mergulho na persona do poeta é uma das muitas delícias que este Mar salgado nos traz. Sugerimos que o leitor experimente mergulhar neste livro como quem assiste a um filme. A cena inicial “edipiana” antecipa o título e os créditos e constrói traços precisos do herói português anti-camoniano, que enfrenta seu desenraizamento entre os despojos simbólicos das armas e dos barões e as pequenas criaturas que vão dando um jeito de viver com graça nos subúrbios da ex-colônia. É deste lugar híbrido, sem saber se “um dia embarcamos/ ou se ainda continuo sentado/ na pedra daquele rio de onde/ deveria ter partido pra américa”, que o poeta penteia seus versos, por uma gente humilde e simples, que, mais que vida, tem biografia.

  • Abnegação

    Abnegação é o terceiro livro de Elesbão Ribeiro. Como em seus outros dois livros anteriores, Estação Piedade e Namorada Anarquista, perpassam os ecos de um mundo em ruínas ao qual o poeta busca dar ordem. Se em Estação e em Namorada verifica-se a presença de uma dicção coloquial, na linguagem mesclada de um português que se dá entre o castiço de Portugal e a inovação do brasileiro; em Abnegação, a língua ganha outros matizes. A língua é o lugar em que as tradições se mantêm e ao mesmo tempo se renovam, é o local em que os sentidos se inovam e se constituem; espaço privilegiado, quando se dá na percepção do poético, a língua é capaz de causar tanto a aproximação com o sublime quanto penetrar no cotidiano mais terra-a-terra da vida comum.

  • Fenda

    Entre o sertanejo é, antes de tudo, um forte de Euclides da Cunha e o dia em que o morro descer e não for carnaval de Wilson das Neves e Paulo César Pinheiro, escancara-se na República dos Estados Unidos do Brasil uma fenda, uma fissura tempo-espacial, um buraco negro que acumula imagens e clichês de um Estado e de um Povo que também possuem entre si outra fenda, um vão muitas vezes intransponível. Mind the gap, atenção para o vão, como as vozes metálicas das estações de metrô, é o que este livro de oswaldo martins pretende dizer. Os poemas de fenda constituem-se como pontuadores de uma narrativa épica brasileira. Eu conto e o senhor põe ponto, diria o jagunço do Grande Sertão. É claro que o leitor não encontrará na poética oswaldiana o conto, a fábula. toda narrativa capaz de engendrar ilusões sobre as ideias de pertencimento, cidadania, republicanismo no Brasil é, aqui, voluntariamente omitida. O poeta põe apenas os pontos e com eles traça retas e planos que trazem à tona o que é sistematicamente silenciado. Vira do avesso o buraco negro dessa história e compõe, como um curador atento, uma galeria de personagens e fatos que unidos no revés histórico (…) pespegam no nosso mundo / faíscas de luta e liberdade”. com os poemas de fenda o estatuto da cultura aflora da radicalidade dos versos como extrato de raízes profundas de um brasil supostamente esquecido ou relegado, mas que é, sim, sistematicamente silenciado à bala. oswaldo martins é um poeta incontornável do panorama das letras brasileiras do século XXI. A cada livro compreende-se mais a construção de uma obra sólida e estável. Sugerimos que o leitor observe a coesão entre a repontuação da história dos poemas de fenda, as blagues e os chistes das desimitações, e os delírios verbais de manto. esses livros compõem uma trilogia (involuntária?) em que as questões da ordem pública, da política, do mundo supostamente organizado, são milimetricamente postas à prova pelos versos de um lirismo enxuto, evidência de que até a emoção, como pretensamente é encontrada no sentimentalismo dos versos até hoje românticos, precisa ser revista e reinventada em nome da poesia e de seu poder de subversão.

  • Namorada anarquista

    O livro Namorada anarquista e outros poemas elabora personagens que transitam por imaginoso e imaginário medievalismo contemporâ neo. Poderes da bruxa e da nobreza presidem à busca de beleza e felicidade de rostos e máscaras. Por entre um burguês em primeira pessoa e os poderes da anarquista namorada que viria das manifestações das ruas de metrópoles em junho de 2013, mas sem que se reduza a datas, aparecem, noutras partes, um discípulo imberbe, o seu (padre) mestre, a diarista portuguesa. Figuram aí, também, saídos de humoradas releituras, Taoísmo, Machado de Assis, Manuel Bandeira, Gregório de Matos e o monge trapista Thomas Merton. Pisando em ovos para abordar diretamente junho de 2013, o poeta compositor Gilberto Gil lembra “o grande líder chinês” que, perguntado sobre a Revolução Francesa, disse: “Ela é muito recente, não sei ainda o que dizer sobre ela”. Com a publicação de Namorada anarquista e outros poemas, o poeta e contista Elesbão Ribeiro sugere procurar reinventar o eu, a partir dessa fala feminina, nomeada (namorada), e marcada por um comportamento (anarquista) menos político do que afetivo.

  • Estação Piedade

    Estação piedade é um livro de poemas com a intensidade e a presença de uma sala de cinema. Traz o frescor de um olhar não condicionado sobre diversos temas, como o corpo, o amor, o tempo, a cidade, a religião, em versos bem medidos, enxutos, que criam uma expectativa no leitor que deriva do caldo cultural que perpassa a experiência urbana nestes últimos quarenta anos. Os poemas, como quadros de um filme sucedem-se em histórias, desde os cinemas dos bairros que se transformaram em templos religiosos às festas populares como a celebração de Cosme e Damião. O sotaque pisca o olho para a herança portuguesa, mas convive habilmente com a boa malandragem, nos seus recantos mais sutis da linguagem. Assim, as percepções da alma e do corpo, sobretudo o feminino, se entregam a uma aguda sondagem da presença, na poesia, de uma especificidade tanto corrente quanto inusitada. O bom negro, o bom branco e o bom sotaque d’além-mar, em Estação piedade, gingam no corpo das belas mulheres, no olhar deste poeta surpreendente.

  • Sutur

    Em Sutur, o poeta Cândido Rolim apresenta, para além da acuidade com que enxerga a realidade, uma densidade cujo desdobramento se dá na forma com que trabalha seus poemas. O modo de operação dos poemas vai se construindo aos poucos, complementando ao longo de todo o livro esse primário dizer que faz com que a poesia de Cândido Rolim se mostre necessária e pulsante frente a este mundo de construções falseadoras do real, por ele, mundo, se contentar com a repetição do mesmo. Se o mundo opera com o preenchimento dos vazios pela positividade dos sentidos, a falta desta positividade, em Rolim, pressupõe seu preenchimento a partir dos desdobramentos dos vazios em mais vazios; como os móbiles de Calder, a construção da poesia de Sutur se mostra na configuração do momento de leitura. O que, aliás, é mais do que necessário no panorama da literatura contemporânea.

  • Coisa diacho tralha

    Segundo o autor, “cada livro tem vários livros por dentro. O que o autor escreveu, o que ele nem sabe que escreveu, o que imagina ou intui. E há todos os livros que os leitores vão criar, misturando suas experiências de vida e leitura com as experiências escritas nas páginas”. Nos “vários livros” de coisa diacho tralha, Cesar relê o amor, a história do Brasil, a mulher, a religião e a própria poesia. O amor, este pêndulo que vai do desejo à dor, nos direciona e perturba, percorre o livro.

  • Rebute

    O livro Rebute de André Capilé propõe ao leitor um complexo e sutil jogo no qual proposição e recepção buscam sempre iniciar um adiamento do tempo que se quer insabido quando se anuncia que o pré-sabido do uso comum da linguagem se transtorna e se transforma na deriva poética do autor.